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O treinador, 62, os últimos 47 vividos nos gramado, considera que vaidade, apatia, deslumbramento e falta de comprometimento são problemas que atingem o futebol brasileiro como um todo e que ameaçam seu futuro.
À Folha, Leão fez duras críticas a toda uma geração de atletas. Sobrou até para Neymar, que levou bronca pela recente aparição em um iate.
Folha - Após tanto tempo, você ainda leva os problemas do futebol para fora do campo?
Emerson Leão - Quem trabalha com o futebol e não tem emoção deixou de trabalhar com futebol. O stress é muito mais fora do que dentro. Quando você está dando treino é um deleite, mamão com açúcar. O duro é o resto. As pessoas que são pagas para dizer sim e não envelhecem primeiro, são mais solitárias e se desgastam mais. É só a ver a foto do Barack Obama antes da eleição e agora. É cansativo.
Mas a derrota é algo que você ainda não aprendeu a digerir?
Depende da derrota. Essa de sábado [virada por 4 a 3 contra o Bahia], eu não conseguiu digerir, não. Continuo falando para eles, tentando fazer eles captarem minha mensagem. Mas estou satisfeito com o que estou fazendo. Mas já dei um prazo para mim: quando eu fizer 50 anos de gramado, vou tentar deixar os gramados. Eu tenho prazo de validade, como uns imbecis falaram. Com 47 anos de carreira, você acha que já viu de tudo. Mas cada geração que aparece tem novidades. Tem o social, que invadiu a vida dos jogadores, o promocional. Hoje tem que se cuidar, você lida com celebridades, com patrimônios. Tem que saber como você caminha. Nesta minha parada [ficou 14 meses sem trabalhar até aceitar convite do São Paulo], deu para entender bem esta nova geração.
E falta a esta nova geração um pouco do sentimento de não digerir derrotas? É uma safra de jogadores que se importam menos?
Acho que é uma geração que não está tão compromissada com o profissionalismo e o dever. Tem alguns que ainda acham que estão jogando sem compromisso, que não perceberam o que gera a indústria do futebol. Por isso que continuamos assistindo a alguma irresponsabilidades. O que falta é a competição com os outros. O cara joga a hora que quer porque sabe que é melhor do que os outros. Se tivesse um cara colocando na bunda dele, junto com ele, se ele fosse para o banco de reservas, quero ver se ele não mudava.
Ricardo Nogueira/Folhapress
Emerson Leão dá entrevista no CT; clique na foto e veja galeria com imagens históricas do ex-jogador e técnico
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Logo que chegou ao São Paulo, você falou com o Casemiro, viu que ele tinha dois brincos e disse: 'Não'. É difícil colocar na cabeça dos jogadores que o foco deve ser a vitória?
A nova geração de homens usa brinco e tatuagem. Porque é a geração da noite, do funk, do piercing. Não é a geração da liberdade, da constatação, como foram os hippies. É a geração da vaidade, da autoafirmação. Mas eles, artistas, dançarinas de bunda de fora, jogadores, foram capturados [pela indústria da fama]. Todo time tem uma ou duas exceções, e elas são tratadas como bibelôs. Eu tenho um Picasso em casa e ninguém pode ver.
Isso estraga os jogadores?
Está contribuindo. Cada vez dão liberdade maior, porque você fica com medo de repreendê-los, de orientá-los porque ele são os fulaninhos.
Essa vaidade atrapalha a competitividade?
Atrapalha em qualquer profissão, atrapalha ele. Em curto prazo, é maravilhoso. Mas quantos começaram assim e ficaram pelo meio do caminho? Aparecem muitos, mas poucos se consolidam.
A culpa é de quem: clubes, empresários ou sociedade?
As três coisas. O dirigente sabe que ele é um patrimônio. O empresário, quanto mais o jogador mudar de time, melhor para ele. Ele só ganha nas transferências e nas publicidades. E a sociedade abraçou isso. É só você ver o que aconteceu na USP. Os caras estão sendo presos por causa de um delito, se revoltam com a polícia, invadem um departamento, explodem tudo o que veem pela frente e querem sair aplaudidos. É sinal dos tempos. Tem exemplos que não dá para aceitar.
O São Paulo te contratou exatamente para conter esse clima. A situação do São Paulo é pior do que a dos outros times?
Os outros clubes pagam pelo mesmo mal. Mas alguém tem que falar, tem que conferir a nota. Mas pouca gente quer fazer isso, quer perder tempo, deixar de ser bonzinho e conferir a nota. Outro dia, se eu não confiro a nota em um bar tenho que pagar duas garrafas de vinho. Tem gente que diz que essa é uma atitude antipática. Antipático é eu deixar meu carro no restaurante, ele emprestar para um ladrão, guardar na rua, em frente da minha casa, e entregar todo ralado. O chato é o que faz o que antigamente era normal. Ser honesto e trabalhador virou virtude. Ser honesto é virtude? Pô, é mais do que obrigação. Dizem que sou polêmico, duro. Não sou nada disso. Só sou verdadeiro. Acho que é por isso que meu prazo de validade é muito longo, 47 anos.
Você tem impressionado por fazer muitos treinos de fundamento. Você acha que as categorias de base não estão conseguindo entregar os jogadores tecnicamente prontos para subir?
Não, não na maioria dos casos. O investimento tem sido maior do que o retorno. A nossa reposição de peças não é mais a mesma. Não é porque é da base que é bom. Não é porque é jovem que é bom.
O fanatismo religioso de alguns jogadores é problema?
Eu já dirigi time que, de 20, 16 eram de uma comunidade. Você falava aqui, e o pastor mudava tudo de lá. Eu falei: 'presidente, vamos tomar uma atitude?'. Ele disse: 'mas Leão, aí vamos ficar sem jogadores para jogar". Lógico que tem os que te ajudam, mas tem os aproveitadores. Isso vale também para os empresários. Se eles apresentam um negócio, devem ganhar dinheiro com isso. Mas eles não estão satisfeitos: querem ser os donos. O jogador religioso perde um pênalti, perde outro e fala: 'Deus quis assim'. Pô, colabora com ele. Todo mundo pede coisa para ele. 'Mas no futuro ele vai me reservar coisa melhor'. Sério, já cansei de escutar isso.
Aceitaria que um jogador seu fizesse o que você fez quando era jogador e posasse para uma propaganda de cuecas?
Não vejo problema nenhum. Você precisa saber o que vai fazer e a conduta que vai ter. Quando eu era goleiro, fiz uma propaganda do frango Sadia. Imagina a responsabilidade que isso me trouxe. Cobrei mais cachê, mas me dediquei mais. Podiam até falar que era filho da puta, mas não que eu era relapso. Se você tem muito oferecimento, toma cuidado com ele. Pode ser prejudicial. Quando eu era jogador, sempre dormia cedo. Eu dependia do meu corpo, do meu reflexo. Se você treina sem condições, seu treinador percebe. Lógico, ficou sem dormir, estava cheirando.
Homero Sérgio-18.jul.1985/Folhapress
Outdoor em São Paulo, com Leão de cueca; clique na foto e veja imagens da carreira do técnico
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O consumo de drogas no futebol está aumentando?
Infelizmente, o atleta profissional é muito vigiado por traficantes e oferecedores. Às vezes, o ópio não está na maconha ou na cocaína, está no oferecimento. Daqui a pouco, um atleta mal preparado se ilude. Se cai na mão dele alguma coisa que ele não está acostumado, ele se apaixona. Mas ele não é obrigado. Todo dia recebe cinco convites diferentes para festa. Mas você vai se quiser. É lógico que fiz tudo isso [curtir a noite], mas tem tempo para tudo. Agora, parece que eles gostam de fazer e aparecer.
Precisam dos holofotes?
O atleta é holofote. As pessoas se aproximam dele para aparecerem nos holofotes. O que você viu na internet hoje [ontem]? O maior craque que nós temos [antes da entrevista, Leão havia criticado a festa dada por Neymar em um iate e o fato de ele ter sido fotografado ao lado de mulheres de biquíni, o que, na visão do treinador, seria um desrespeito com a mãe do filho de menos três meses do atacante]. Há folgas e folgas. Parte do treinamento você faz quando está fora dos campos.
Te incomoda ser sempre chamado de duro e polêmico?
Não. Só vai me incomodar quando me chamarem de desonesto, vagabundo, mau caráter. Aí, vão estar entrando em uma particularidade. Não tenho de dar explicações.
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